quinta-feira, 9 de maio de 2013

Carta de professor da FFC sobre o perrengue em torno do CCI [Creche da universidade]


Caros pais e mães,

tenho acompanhado apreensivamente este debate acerca da paralisação do CCI.

Gostaria de manifestar, aqui, minhas considerações.

Antes de mais nada, expresso a minha solidariedade em relação à situação angustiante, objetivada nesta troca de mensagens.

Como todos devem saber, também por aqui, nos tornamos pai e mãe recentemente.E ainda estamos perplexos com as implicações profundas deste recente acontecimento.

Só quem passou por este rito de passagem conhece efetivamente as dificuldades que envolvem este momento.

Reconheço que a situação é particularmente difícil para as mães, seja em função das desigualdades de gênero, da divisão sexual do trabalho, ou em função da especificidade biológica que atribui à mulher a responsabilidade da amamentação.

E como se não bastassem as dificuldades naturais inerentes à maternidade/paternidade, esta experiência ocorre num momento histórico e num contexto social particularmente  difícil. Sem exageros, não tenho dúvidas de que vivemos o colapso de uma "civilização". Além da atual condição dos pobres pelo mundo todo, a atual condição dos jovens talvez seja uma das expressões mais alarmantes da crise estrutural deste modelo de sociedade em que vivemos. A irracionalidade do método de luta empregado pelos nossos estudantes expressam este momento caótico. O que estamos vivenciando decorre destas circunstâncias histórica e socialmente determinadas; desta crise de sentidos generalizada e da busca desesperada de um sentido para a vida. A atual conjuntura não se reduz a uma crise estritamente econômica, sua extensão e profundidade vai muito além, perpassa as relações do cotidiano, as relações interpessoais. Atomiza o indivíduo, virtualiza os contatos pessoais. Enfim, este é o mundo que se coloca diante de nós e que também os nossos filhos já estão enfrentando. Não acredito que seja possível, por amor, isolá-los completamente deste contexto. Nosso esforço desesperado consistirá em amenizar as repercussões, prepará-los para enfrentar as contradições do mundo e não fugir delas. Se num primeiro momento o movimento estudantil aparece, não apenas como expressão fenomênica da crise, mas também como um grande obstáculo ao restabelecimento das nossas vidas cotidianas, entendo que a essência do problema não se reduz à inconsequência intransigente destes estudantes, mas a um contexto muito mais amplo, que nada tem de natural. Considero fundamental reconhecermos que a atual conjuntura é o produto histórico de decisões humanas, sejam tomadas de modo consciente, ou não. E estes responsáveis por todo este caos têm nomes, sobrenomes, partido político e interesses muito bem definidos; ocupam posições de poder, de prestígio social; e a seu serviço estão os meios de comunicação, a polícia, o exército e muitos dos políticos dentre os quais encontram-se os próprios governadores e reitores das universidades. Em nome dos interesses destes Senhores do Caos, atropelam os direitos trabalhistas, precarizam as condições de trabalho, de educação, rebaixam salários e se apropriam das nossas aposentadorias; abrem novos cursos de engenharia em detrimento da formação de mais médicos e professores. Para perpetuar este domínio dispõem de uma série de meios, dentre os quais o mais decisivo é assegurar a desagregação dos coletivos da classe trabalhadora. A quebra da isonomia salarial entre os segmentos, a bonificação de 6mil reais apenas para professores e funcionários da USP, o ranqueamento das universidades institucionalizando a competição entre os pares, todas essas medidas comprovam esta afirmação. A imposição de critérios fabris de avaliação sobre a atividade docente e a produção de pesquisa, a sobrecarga de trabalho, todos estes elementos já vinham fazendo de nossas vidas um verdadeiro inferno! Por isso, penso que devemos enfrentar as dificuldades coletivamente, canalizar nossas indignações, concentrar nossas forças e atirar na direção correta. Independentemente de nossas titulações, a dependência de salários faz de nós trabalhadores assalariados, tanto quanto os demais. Enquanto tais, nossa força reside na possibilidade de nos unirmos politicamente contra um inimigo comum, real e muito mais poderoso do que o movimento estudantil. A guerra de todos contra todos nos enfraquece. 

Pessoalmente, não posso responsabilizar a direção local, nem o estudantado e muito menos os funcionários da instituição, por não ter conseguido uma vaga para o meu filho num CCI superlotado, sem espaço, ou subquadro de funcionários; nem pelo fato de minha esposa estar desempregada após o vencimento de seu contrato temporário de professora substituta; ou pelo fato de ter as relações pessoais e familiares comprometidas pelo excesso de trabalho; muito menos pelo recente golpe que retirou de nós, docentes, o direito à aposentadoria integral. Os responsáveis estão fora daqui e existem de fato.

Se me dou ao trabalho de redigir esta extensa carta enquanto meu filho chora e os prazos vencem, é porque acredito na possibilidade de intervirmos coletivamente e conscientemente nos rumos da história.

Por fim, manifesto meu apoio à iniciativa dos pais, dispostos ao trabalho auto-gestionado, seria um bom momento para fortalecer os laços entre as categorias e as gerações envolvidas neste processo.

Saudações fraternas,

Fábio Kazuo Ocada

2 comentários:

  1. O professores estão divididos. Uns compreendem a urgencia das pautas e apoiam a greve e ocupação, outros desacreditados nos rumos da humanidade, lamentam, se deprimem e atacam @s estudantes que se negam a aceitar as coisas como estão.
    Só pra lembrar, a posição do Mazzeo que vai de encontro com a do Ocada:

    "Carta de apoio do Profº Antonio Carlos Mazzeo da FFC-UNESP\Marília

    EU APOIO A GREVE DOS ESTUDANTES DA FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS DA UNESP/MARÍLIA

    Estudantes da Faculdade de Filosofia e Ciências da UNESP estão em Greve, reivindicando mais bolsas para possibilitar a permanência de estudantes oriundos de famílias de trabalhadores na Universidade, além da ampliação do atendimento do Restaurante Universitário, que serve apenas 300 refeições no almoço e 150 no jantar, para um contingente estudantil que é aproximadamente 7 vezes maior. Além disso, os estudantes reivindicam também, melhores condições de ensino e de pesquisa.
    Apesar da Assembléia da Adunesp de Marília (sindicato dos professores da Unesp), com maioria esmagadora, ter deliberado apoio às reivindicações estudantís, alguns professores procuram solapar a greve com os argumentos dissimulados e conservadores de sempre - de que a greve é "intempestiva", de que desejam "liberdade para trabalhar", que se sentem "ameaçados" pelos estudantes, de que são pagos com dinheiro público e que por isso devem entrar em sala de aulas, etc - mas, de fato, escondem uma real posição hostil e contrária às mobilizações estudantís.
    De público, quero manifestar meu apoio à greve dos estudantes e o respeito à deliberação da Assembléia da Adunesp.
    Não dá para enganar. Quem apoia a consistente pauta de reivindicações dos estudantes apoia a paralização, sem senões, sem vacilações.
    Nesse momento ficar no muro é objetivamente estar do lado de lá das barricadas ... eu estou com os estudantes".
    Todo apoio a greve e ocupação!
    Alessandro de Moura, doutorando em ciencias sociais pela Unesp-Marilia.

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  2. A propósito. Ontem, dia 8 de maio, os estudantes de todos os programas de pós-graduação do campus de Marilia, reunidos em assembléia, deliberaram pelo total e irrestito apoio à greve e ocupação. Ainda, além do apoio, os pós-graduandos da FFC também estão em greve pelas pautas que levaram à greve e ocupação.

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